Gazeta Buenos Aires - Marcha do Silêncio completa 30 anos no Uruguai marcada por morte de Mujica

Marcha do Silêncio completa 30 anos no Uruguai marcada por morte de Mujica
Marcha do Silêncio completa 30 anos no Uruguai marcada por morte de Mujica / foto: Dante FERNANDEZ - AFP

Marcha do Silêncio completa 30 anos no Uruguai marcada por morte de Mujica

Quatro décadas após o retorno à democracia, os uruguaios ainda se perguntam onde estão os quase 200 detidos desaparecidos durante a última ditadura militar. Nesta terça-feira, assim como acontece há 30 anos, uma multidão marchou em silêncio para exigir que as buscas avancem.

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A passeata avançou pela mesma avenida de Montevidéu que reuniu milhares de pessoas na semana passada para o cortejo fúnebre do ex-presidente José "Pepe" Mujica. Diferentemente das lágrimas e bandeiras partidárias que se despediram do ícone da esquerda latino-americana, o público marchou hoje sem distintivos políticos, em um clima solene, acompanhado de cartazes com fotos em preto e branco dos desaparecidos e slogans referentes à sua busca.

O silêncio foi quebrado quando os nomes dos quase 200 desaparecidos foram pronunciados pelos alto-falantes. Em uníssono, e após cada nome, a multidão exclamou: "Presente!"

Lucía Topolansky, ex-vice-presidente e viúva de Mujica, compareceu à manifestação. No ano passado, ela participou com o líder uruguaio, que também marchou quando ocupava a Presidência (2010-2015) e que completaria hoje 90 anos.

"Lembro-me de dizer: 'Isso vai acabar no dia em que todos nós desaparecermos'". "Eu estava errado", disse Mujica, um ex-guerrilheiro que suportou 13 anos de prisão em condições desumanas durante a ditadura. "Há coisas que os seres humanos não esquecem."

- Proibido esquecer -

O Uruguai também não esquece. Assim como em cada maio, nomeado "mês da memória" no país, nos dias que antecederam a marcha, os familiares levantaram sua voz.

"Não sabemos se o silêncio [dos responsáveis] será quebrado, mas seguimos comprometidas com a denúncia, com o que construímos como sociedade, com a consciência de que o terrorismo de Estado ocorrido no passado está determinando nosso presente", disse à AFP Elena Zaffaroni, integrante do coletivo Madres y Familiares de Uruguayos Detenidos Desaparecidos. Na mesma linha, María Bellizzi disse que é preciso "saber a verdade, tudo o que fizeram, onde estão [os desaparecidos], quem são os genocidas".

María, 100, e outras mães receberam ontem o reconhecimento do governo uruguaio por sua busca incansável, que, para ela, começou em 1977, com o desaparecimento do seu filho.

O coletivo Imagens do Silêncio, que ajuda a convocar a marcha há dez anos, instalou nos últimos dias cartazes gigantes com imagens de ossos encontrados no Uruguai. As imagens "mostram que eles estavam lá, que estavam nos batalhões, e isso demonstra a mentira sistemática" sobre o paradeiro dos desaparecidos, disse à AFP Soledad Acuña, integrante do grupo.

Assim como María Bellizzi, alguns manifestantes disseram esperar avanços durante o governo de esquerda do presidente Yamandú Orsi, que assumiu o cargo em março e é herdeiro político de Mujica.

Desde o fim da ditadura (1973-1985), período que incluiu três mandatos presidenciais da coalizão de esquerda Frente Ampla, os restos mortais de oito pessoas desaparecidas foram identificados.

Registros oficiais somam 197 pessoas desaparecidas, a maioria foi detida na Argentina no contexto do Plano Condor, uma colaboração entre regimes vizinhos. Dezenas de militares, a maioria reformados, foram condenados por crimes cometidos durante a ditadura.

A ministra da Defesa, Sandra Lazo, afirma que está trabalhando em busca de progressos. "O Ministério hoje deve ser um facilitador, uma ferramenta para essa busca pela verdade", disse Lazo à AFP após participar da homenagem às mães dos desaparecidos.

P.Quiroga--GBA